A querela se deu em torno de duas questões. A primeira disse respeito ao aumento da alíquota de descontos (para empregados e empregadores) do INPS de 8% para 10%. Golbery julgava que antes de aumentar, o governo deveria buscar se livrar de desperdícios e falhas do sistema previdenciário. A segunda disputa referiu-se à ideia, defendida por Golbery, de proporcionar a todos os servidores públicos o 13o salário, como compensação à perda do FGTS.
Nas duas batalhas, Delfim saiu vitorioso, conseguindo o apoio do presidente João Batista Figueiredo. O argumento de Delfim: não tem dinheiro. Logo, era preciso arrecadar mais – no caso do INPS – e não criar mais gastos – no caso dos servidores. Golbery, um estrategista político antes que administrador, pensava em outra chave. Ele buscava apoio popular, para utilizar palavras contemporâneas, visava aumentar a aprovação do governo; aprovação que se desdobraria num maior apoio ao PDS, partido do regime, nas eleições decisivas do ano seguinte. Nesse contexto específico, Delfim Neto encarnou a ideia de responsabilidade orçamentária, de equilíbrio fiscal. Mesmo às custas de não ceder a tentações de popularidade.
Podemos dizer que a opção de Golbery era uma opção maquiavélica, interessada acima de tudo na tomada e manutenção do poder. Não é à toa que em uma de suas famosas frases, sustentou: “Maquiavel não era maquiavélico. Era lúcido”. As consequências econômicas se via depois…
A verdade é que, se foi derrotado no outono de sua carreira, o ideário do general e grande articulador do golpe de 1964 tem prevalecido fortemente nas últimas décadas. Os governos se sucedem – exceção feita ao período de Michel Temer – num furor de gastos, com os olhos voltados para as urnas, num desfile contínuo de propostas e ações populistas. Lula, Dilma, Bolsonaro, Lula de novo… A mentalidade de que “gasto é vida” parece dominar os cérebros dos incumbentes, reforçando a ilação de que é gastando que se mantém no poder.
Tampouco parece haver preocupação diferente por parte dos cidadãos e eleitores. A convivência quase naturalizada com o cartão de crédito estourado parece ser apenas o outro lado de um país no qual os governantes gastam mal e aleatoriamente, desde que a gastança e “bondades” lhes garantam o que de fato interessa: o poder.
Terá a democracia brasileira meios de voltar a um trilho de sustentabilidade, ou será o consórcio formado por massas sempre carentes de mais benefícios e políticos sempre vitorioso em nosso país? Mirando o futuro, e pensando naquele distante 1981, quem tende a ser repetido: Delfim Neto ou Golbery do Couto e Silva?
(*) Autor / Fonte: – Josias Vicente de Paula Júnior – Josias Vicente de Paula Júnior, é professor doutor do Departamento de Ciências Sociais da UFRPE – josias.vicente@ufrpe.br