
Atualidades/Acontece: – No país do assédio telefônico, aposentado e pensionistas viram presa fácil de todo tipo de vendedor digital (*)
No país do assédio telefônico, aposentado e pensionistas viram presa fácil de todo tipo de vendedor digital
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Dados dos segurados do INSS trafegam por vários serviços permitindo que eles sejam abordados com promessa de credito de juros mais baixos
Quem tem parente ou amigo aposentado conhece a história. Todos os dias eles são achacados por correspondentes bancários, via telefone, sempre de posse dos dados e da disponibilidade de crédito consignado.
É um aperreio com pessoas de sotaques diferentes indicando serem de outras regiões, mas como oferta que variam de renegociação com promessa de taxas menores e um crédito novo que embute um aumento de prazo das prestações.
– Conversa igual
O argumento é sempre o mesmo: o segurado, depois de identificado, dispõe de um crédito pré-aprovado com uma taxa de juros menor e que pode ser colocado na conta do aposentado ou pensionista em até 48 horas.
Para quem se dispõe a ouvir o interlocutor é difícil resistir. Salvo se a pessoa contratada resolver “tirar onda” e começar a fazer perguntas de modo a irritar o correspondente bancário. Mas eles não resistem a três perguntas e desligam.
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Não perturbe
E eles perturbam mesmo. Segundo a Febraban, apenas o serviço Não Perturbe recebeu cinco milhões de pedidos de bloqueio até fevereiro último.
Os argumentos de apresentação são criativos: O senhor sabia que está pagando juros abusivos no seu atual contrato de consignado? O senhor sabia que os juros foram reduzidos este mês? Você sabia que pode manter a prestação ainda receber um novo crédito em dois dias?
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Linha de ação
Embora a Polícia Federal ainda não tenha revelado dados sobre como as entidades investigadas conseguiram em tão pouco tempo obter adesão de 50 mil, 100 mil e até 200 mil associados em menos de um ano, está claro que sem uma estrutura de empresas que se dedicam a oferecer crédito consignado – e que diariamente assediam os pensionistas de aposentados – nenhuma delas seria capaz de conseguir tantas adesões.
Isso não quer dizer que as associações usaram a estrutura de call center existente para o crédito consignado para incluir o serviço de adesão às entidades. Mas é que hoje apenas elas têm estrutura para fazer tantos acessos.
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Muita Gente
Os correspondentes bancários hoje empregam mais de um milhão de pessoas no Brasil. São responsáveis por mais de 50% da liberação de crédito para pessoas físicas e jurídicas. O jogo é pesado, pois 65 bancos disputam esse mercado.
Mas não se pode acusar os correspondentes bancários de serem os veículos dessas adesões até que surjam dados que apontem isso.
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Lupi ajudou
Além disso, Carlos Lupi vem de um longo embate com os bancos. Que, aliás, começou assim que tomou posse. Lupi baixou o limite dos juros do crédito consignado do INSS em março de 2023 quando fez o Conselho Nacional de Previdência Social reduzir o teto para 1,7% ao ano. A decisão abriu uma guerra entre os Ministérios da Previdência Social e da Fazenda.
Os bancos suspenderam a oferta, alegando que a medida provocava desequilíbrios nas instituições financeiras. Sob protesto das centrais sindicais, o Banco do Brasil e a Caixa deixaram de conceder os empréstimos porque o teto de 1,7% ao mês era inferior ao cobrado pelas instituições.
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Lula interveio
Foi necessário o presidente Lula da Silva arbitrar o impasse e, no fim de março, decidiu pelo teto de 1,97% ao mês. Lupi perdeu a batalha, mas voltou à guerra depois.
A consequência disso, segundo a ABBC – Associação Brasileira de Bancos, foi que o volume de concessão, comparando o período de maio a agosto de 2022 com o mesmo período de 2023, caiu de R $29,3 bilhões para R$21,2 bilhões.
A média de concessão mensal teve redução de R 7,3 bilhões para R 5,3 bilhões, de acordo com dados do Banco Central. E isso acirrou a busca por novos clientes.
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Não baixou
Para completar, quando a taxa Selic começou a subir, o Conselho Nacional de Previdência Social – presidido por Carlos Lupi – demorou a aumentar a taxa máxima de juros.
O problema do consignado do INSS é que o cadastro dos aposentados e pensionistas está nas mãos dos bancos e por consequência dos correspondentes bancários.
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Dados abertos
Esse acesso à base de dados do INSS permite a um correspondente bancário ter acesso ao contrato de um concorrente e abordar o beneficiário oferecendo uma renegociação.
Em tese, esse é um dado que apenas o INSS e o banco que emprestou o dinheiro deveria ter. Mas virou uma coisa normal o correspondente saber detalhes do contrato celebrado e oferecer um novo crédito renegociação da dívida numa operação de compra de débito com oferta de crédito.
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Informações gerais
Isso acontece porque os dados dos aposentados e pensionistas sem controle do INSS trafegam livremente entre os correspondentes contratados pelos bancos. E foi esse acesso de dados que permitiu a abordagem e em milhares de casos a falsificação pura e simples de dados e contratos de adesão às associações.
E é uma base extraordinária. Apenas a carteira de empréstimos concedidos a beneficiários do INSS chegou a R$281 bilhões em fevereiro, representando 40,67% de todo o consignado oferecido pelo sistema financeiro.
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Qual mecanismo
A Polícia Federal ainda não revelou o mecanismo de contratação. Sabe-se que milhares de pessoas viraram sociais de entidades que sequer tem um departamento comercial cuidado de captar associados.
Por isso, a questão que, em breve, será revelada é que empresas foram encarregadas de abordar os possíveis associados. Até porque está claro que todas elas tinham acesso aos dados dos beneficiários e podiam escolher em que aborda.
- (*) Autor / Fonte: Fernando Castilho Jornalista titular da Coluna JC Negócios do JC