Quando a oportunidade foi criada pelo STF, ele voltou a ser presidente.
Como deu certo?
O que diferencia a estratégia de Lula das tentativas de Collor e Jânio? Lula não convocou as pessoas para evitar ser preso e nem para obrigar o mundo político e jurídico a mudar de ideia sobre ele naquele exato momento. Ele não queria ser absolvido e sair ileso, porque já sabia que não conseguiria.
A intenção de Lula era deixar uma porta aberta para o caso de o mundo político e jurídico mudar de opinião sobre ele. Ao brigar com algo que é maior que você, mesmo que você esteja em vantagem momentânea, é preciso sempre deixar uma chance para o entendimento futuro.
Demora, mas reage
Instituições demoram a reagir, mas quando reagem são como cachorros cercados, mordem tudo pela frente e são avassaladoras. O atual presidente só é o atual presidente porque não tentou colocar o povo para pressionar as instituições, mesmo que o povo dele quisesse até atacar as instituições na época. Mostrou força popular, mas manteve as pontes para o futuro.
Foi preso, mas deixou uma base. O destino e o governo esquizofrênico de Bolsonaro fizeram o resto.
Risco
E por que a manifestação do próximo dia 25 de fevereiro convocada por Jair Bolsonaro (PL) pode dar muito errado para ele? Primeiro porque o ex-presidente tem uma competência indiscutível para derrubar pontes e gerar ódio contra ele até entre os que o apoiaram em algum momento.
Como está habituado a abandonar aliados sempre que está apertado por alguma acusação, como já fez com Mauro Cid, Queiroz e, agora, com o general Augusto Heleno, acaba gerando desconfiança.
Depois, só há duas possibilidades: colocar pouca gente nas ruas e ver a manifestação de apoio se transformar em fiasco ou colocar muita gente gritando o seu nome e piorar a reação das instituições pela confusão que irá causar.
Quem financia?
Para colocar muita gente nas ruas, Lula contou com a estrutura partidária milionária do PT e de partidos aliados, além do financiamento de apoiadores diversos. É difícil dizer até se o PL estará disposto a dar alguma estrutura para a manifestação de Bolsonaro.
Mesmo os apoiadores financeiros habituais do ex-presidente estarão amedrontados com a possibilidade de algo sair do tom e serem acusados de apoiar novos atos antidemocráticos. Então será difícil vir dinheiro daí.
Os olhos da Polícia Federal e do STF estarão mais atentos do que nunca para qualquer convocação e gasto financeiro. Até mesmo políticos ditos bolsonaristas estarão atentos à possibilidade de acabarem engatados na mesma rede em que está Bolsonaro.
Uma coisa é defender ele, outra é ir preso junto.
Provocação
Se, ainda assim, utilizando a aproximação que há entre governo de SP, prefeitura e bolsonarismo, uma multidão for vista no domingo, o ato será visto mais como provocação do que uma demonstração de força, exatamente pelas pontes inexistentes.
A tendência é que a reação seja ainda mais dura, contra ele e contra toda a família. Sem falar nos apoiadores mais próximos.
Declaração
O cientista político Adriano Oliveira, em entrevista à Rádio Jornal na quarta-feira (14), sugeriu que a melhor opção para Bolsonaro atualmente seria fazer uma declaração “reconhecendo e defendendo o Estado Democrático de Direito e as Instituições”, ao invés de esticar a corda. Está correto. É exatamente o ato de tentar refundar pontes para sobreviver.
Do ponto de vista político seria a coisa mais inteligente a se fazer num momento como esse. Mas é difícil imaginar que o ex-presidente faria algo assim.
(*) Autor/Fonte: Igor Maciel – Jornalista e colunista, titular da Cena Política do JC